Falta de incentivo às práticas de conservação de solo, por meio do serviço de extensão rural, expõe o campo e as cidades a extremos do clima
As nuvens de poeira que atingiram cidades do interior de São Paulo e de outros Estados no final de setembro podem ocorrer de forma mais frequente, segundo alerta a Associação Paulista de Extensão Rural (APAER), se não houver investimentos públicos no trabalho de orientação e desenvolvimento de modelos sustentáveis de manejo e gestão no campo. Para a entidade, o Estado abandonou o incentivo às boas práticas de manejo do solo.
“Apesar da importância da conservação do solo, por meio da extensão rural, para favorecer o abastecimento das reservas subterrâneas de água e minimizar as mudanças climáticas, este assunto tem sido negligenciado pelo atual governo do Estado”, diz Antônio Marchiori, presidente da APAER.
Engenheiro agrônomo, Mestre em Agronomia pela Esalq/USP e Doutor em Ciências pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Marchiori diz que as nuvens de poeira são resultado da combinação entre ventos fortes e de uma grande extensão de área agrícola preparada com terra pulverizada na superfície, que facilita a suspensão da poeira. O fenômeno, antes pouco visto no interior de São Paulo, na década de 1930, no século passado, ocorreu em grande escala nas planícies centrais dos Estados Unidos, dando origem ao serviço público de conservação do solo naquele país.
Para a APAER, após a recente tentativa de extinção do trabalho de extensão rural em São Paulo, por meio do fechamento das Casas da Agricultura, a atual gestão insiste em tratar as questões do desenvolvimento rural sustentável com uma abordagem predominantemente burocrática, de regularização ambiental digital das propriedades, “sem apoiar devidamente práticas mais adequadas de cultivo”, afirma. O processo de fechamento das unidades foi suspenso pelo atual secretário, Itamar Borges, em junho.
“A água que brota das nascentes e que alimenta os rios não infiltra apenas nas áreas de mata, mas também em larga escala nas terras de cultivo agrícola, e o mau manejo do solo implica em redução da água que é absorvida”, explica Marchiori. “Em áreas mal manejadas, a terra é carregada para assorear os rios, provocando a morte dos rios no Estado, e as nuvens de poeira na escala que assistimos não podem ser consideradas como algo normal. É a natureza nos alertando que algo precisa ser feito.”
A APAER destaca que, apesar do aumento na demanda por serviço de extensão rural no Estado, nas últimas décadas, o quadro de funcionários da Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA) foi reduzido a menos da metade. “A falta de apoio para uma agricultura mais sustentável em São Paulo também pode ser percebida pelo atual orçamento da Secretaria da Agricultura, o segundo pior do Brasil”, estima a entidade, de acordo com levantamento feito por meio de Diários Oficiais.