//A boa energia vinda do campo

A boa energia vinda do campo

Biomassa da cana: a melhor alternativa econômica e sustentável para aumentar o suprimento de energia elétrica

Nas casas e nas empresas, os brasileiros sentem no bolso o peso da energia elétrica no equilíbrio de suas despesas. Novos aumentos são anunciados, enquanto o Brasil busca em fontes não renováveis a energia elétrica que precisa para a vida diária e para impulsionar o desenvolvimento.

Entretanto, a alternativa mais econômica e ambientalmente correta já está disponível e vem do campo: é a geração de energia a partir da biomassa da cana-de-açúcar.

Atualmente, a principal fonte de produção de eletricidade no país advém das usinas hidrelétricas, sendo um total de 65%. Porém, segundo especialistas, a produzida a partir da cana é, sem sombra de dúvidas, a melhor alternativa junto à hídrica em se tratando de fonte renovável.

“O encaixe é perfeito, a energia elétrica produzida a partir da biomassa é gerada no período de escassez das chuvas, durante a entressafra da energia hídrica e a energia hídrica é gerada no período de maior intensidade de chuvas, justamente nos meses de entressafra da energia produzida pela biomassa da cana. O que resulta em uma excelente sinergia”, explica o coordenador industrial da Usina Colorado, o eng. agr. Paulo Carvalho.

A geração de biomassa do setor sucroenergético deu uma enorme contribuição para o setor elétrico no ano de 2017, evitando o esvaziamento dos reservatórios do Sudeste e Centro Oeste em 15 pontos percentuais. O atual nível de 35% dos reservatórios estaria em 20% não fosse a geração das Usinas de Açúcar e Etanol, conforme informações da Cogen (Associação da indústria de Cogeração de Energia) tendo como fonte ONS/CCEE.

 Alta Capacidade

Levantamentos da União da Agroindústria Canavieira – UNICA informam que o potencial técnico da Bioeletricidadesucroenergética para a rede é aproveitado em somente 15% de seu total.

Considerando a safra 2017/18, o potencial poderia chegar a 144,8 TWh, algo em torno de 4 usinas do porte de Belo Monte. Todavia, foram exportados apenas 21,4 TWh. “Essa diferença demonstra a existência da grande oportunidade que temos para aproveitar esta fonte de biomassa, sem aumentar a área de terra para o cultivo de cana. Enquanto a energia hídrica exige o alagamento de uma enorme área”, apresenta Carvalho.

O próprio Grupo Colorado, em suas duas Usinas (Colorado e Central Energética Morrinhos), possui Unidades Termoelétricas com potência instalada de 75 MW podendo chegar a 250 MW.

“Descontado o consumo próprio, daria uma exportação de energia de 200 MW, o equivalente para uma população de aproximadamente 500.000 habitantes, isto levando em consideração as áreas urbanas, comerciais, industriais e agrícolas (Fonte: IEA Data Services 2016 MME)”, calcula o engenheiro agrônomo.

A energia da Colorado

A Usina Colorado, localizada em Guaíra (SP), iniciou sua moagem em 1982, já com cogeração de energia autossuficiente. Em 2008, com a ampliação da empresa, passou a exportar o excedente de energia, deixando de ser uma unidade autoprodutora para se transformar em produtora independente.

Já a Central Energética Morrinhos – CEM, situada em Goiás, começou a moagem em 2009, com cogeração e autossuficiência e, a exportar a excedente em 2012.

“Praticamente todas as Usinas de Açúcar e Etanol durante a safra, são autossuficientes em energia. Ou seja, produzem o que consomem em seus processos.” – Paulo Carvalho

 Potencial desperdiçado

Mas então, por que o setor não aproveita o seu potencial técnico e fornece toda a energia excedente para alimentar o consumo do país?

O especialista explica que, antes de tudo, cabe lembrar que a introdução da fonte de biomassa no Sistema Elétrico Nacional foi um grande aprendizado, demandando muitas negociações regulatórias e entendimentos operacionais por se tratar de um sistema de geração diferente dos convencionais da época. “Foi uma grande evolução graças à capacidade e boa vontade dos players envolvidos, tanto do setor da biomassa como das instituições do Setor Elétrico. Hoje, ainda existem entraves, considero que dois são os principais que desestimulam e desencorajam o crescimento do setor de geração de energia elétrica a partir da biomassa de cana de açúcar”, diz Paulo, apresentando-os:

“O primeiro entrave é para pequenos aumentos de geração, como melhorias de eficiência energética, troca de equipamentos com potências maiores, utilização de palha da cana etc., que podem possibilitar incrementos com pequenos projetos e ou estratégias operacionais e comerciais.”

Nestes casos, os geradores terão um incremento de energia que ultrapassará sua Garantia Física (Volume de energia liberado para comercialização). Este volume excedente será direcionado ao MCP (Mercado de Curto Prazo), que atualmente paga em média 5% do total devido ao gerador. O restante fica retido na CCEE em função da Judicialização relacionada ao déficit de geração das hidrelétricas.

“Os geradores, não recebendo, são desestimulados a realizar as estratégias que serviriam para aumentar a geração de energia que poderia amenizar e diminuir a geração de térmicas emergenciais, provocando uma redução de preço e bandeira vermelha, não pesando no bolso da população”, ilustra o profissional.

Segundo a UNICA,não há como estimular uma geração extra pela biomassa com o imbróglio jurídico que vive o MCP e suas liquidações financeiras, com os geradores sucroenergético assumindo os custos da operação sem terem o respectivo pagamento pela energia gerada para a rede. Situação que se arrasta sem solução efetiva por mais de três anos.

O segundo entrave é para projetos maiores que estarão direcionados para o melhor aproveitamento do potencial técnico da geração de biomassa. “Neste caso, é importante ressaltar que a energia gerada não é consequência da produção do açúcar e etanol. Todo investimento é único e exclusivo para aumento de geração de energia elétrica, é a troca dos equipamentos existentes como caldeiras, turbinas, geradores, subestações e ETAs qualificados para produção de açúcar e etanol, pelos mesmos equipamentos, porém com configurações voltadas tanto para produção, como também para geração de energia elétrica. É uma mudança do parque industrial, substituindo equipamentos sem aptidão para geração de energia elétrica por novos equipamentos que atendem a este quesito.”

Valores

Para que tudo isto seja possível, as empresas apontam que é importante uma revisão do valor de referência (Preço em R$ do MWh) da biomassa, pois hoje, os preços praticados estão muito aquém para viabilizar investimentos de projetos para melhoria do potencial técnico de geração.

É importante constatar que a energia de biomassa além da sinergia com a energia hídrica, está próxima às linhas de transmissão e tem total confiabilidade e segurança em sua geração, porque seu combustível “biomassa” é originário da cana obtido na produção de açúcar e etanol, independente de condições naturais e climáticas, como ventos e sol, necessárias para outras fontes de energias renováveis.

Biomassa X hídrica

De acordo com o boletim da União da Agroindústria Canavieira, atualmente, a capacidade instalada e outorgada no país é de 167.232 MW. A fonte biomassa em geral (que inclui as diversas biomassas) representa 9% dessa potência outorgada pela ANEEL na matriz elétrica do Brasil, ocupando a 3ª posição, atrás das fontes hídrica e fóssil.

Com referência somente à cana, o setor sucroenergético detém hoje 11.373 MW, em torno de 7% da potência outorgada no Brasil e 77% da fonte biomassa, sendo a 4ª fonte de geração mais importante da matriz elétrica em termos de capacidade instalada, atrás da fonte hídrica e das termelétricas a gás natural e das eólicas.

O Estado que mais gerou bioeletricidade para a rede, em 2017, foi São Paulo, responsável por 47% do volume total no período. Somente a geração sucroenergética paulista para a rede em 2017 foi equivalente a 20% da produção de energia elétrica no Estado ou a atender 44% do consumo total anual na capital paulista.

Mas então, por que o governo não aproveita e investe para que as usinas disponibilizem o recurso na época da seca?Essa falta de investimento público faz com que apenas algumas consigam vender o excedente para o sistema nacional.

De acordo com a UNICA, para que este mercado cresça e contribua para o consumo brasileiro, reduzindo os custos nas contas dos brasileiros, é importante uma política setorial estimulante e de longo prazo, com diretrizes claras e de continuidade, buscando garantir o pleno uso eficiente deste recurso energético renovável na matriz de energia do país.

Essa alternativa sustentável teria reflexos positivos. Basta o governo priorizar o crescimento do Brasil e entender que não é a falta de recursos que atravanca o desenvolvimento, mas sim a falta de energia para crescer.